19/03/2016

Presidente da Veiling Holambra diz que é preciso estimular consumo de flores para driblar crise

ENTREVISTA: Joost van Oene defende a criatividade e a tecnologia como principais aliadas para aumentar o faturamento dos produtores.

Apesar do mercado de flores atingir a casa dos R$ 6 bilhões no ano passado, o lucro dos produtores continua a mercê da economia nacional. Isso é o que defende o presidente da Cooperativa Veiling Holambra (CVH), Joost van Oene, durante a 13ª feira Veiling Market.

Segundo ele, é preciso ter criatividade nesses momentos e deixar de lado o ego para atrair mais consumidores, dando a eles o que querem. “Você tem que saber o que o cliente quer, a durabilidade do produto, as tendências de cor e se é lucrativo. Baseado nisso você toma a decisão. É fácil? Lógico que não. Mas se você está nesse ramo precisa procurar.”

Joost veio da Holanda para o Brasil em 1986 e começou a cultivar verduras em uma propriedade no interior de Holambra. Três anos depois entrou no mercado de flores com a produção de kalanchoes e se firmou neste segmento. Hoje, presidente reeleito da Cooperativa, ele vislumbra o mercado de flores como um desafio, mas aponta escapes para a crise. “O mercado de flores pode crescer muito ainda, mas isso vai andar junto da economia do país. O que temos que fazer é estimular consumo.”

Como se deu sua vinda ao Brasil? A primeira vez que vim ao Brasil foi em 81, como mochileiro, viajando. E morando aqui definitivamente desde 86. E em 86 eu comecei com produção de verduras, em Holambra, e desde 89, de flores.

Sentiu muita dificuldade devido a diferença de solo brasileiro e holandês? Não. Minha profissão de formação é eletricista. Não sou do ramo de flores e plantas, e nem de verduras. Eu comecei aqui junto com alguns amigos em verduras e depois passei para flores. E se você tem vontade você pode fazer tudo. Comecei pequeno. E quando você começa pequeno você pode errar. Mas foi crescendo, crescendo e hoje a principal atividade é flor: violeta, antúrios, gérberas. Eu comecei com kalanchoe e hoje só produzo kalanchoe. No Veiling, se você faz a venda através do Veiling, você pode optar por um produto. E você se especializa nisso. Isso se torna atrativo para o cliente porque você tem todo dia e tem as novidades e os volumes que eles querem. Quando você mesmo vende, por meio do Ceasa, você tem que vender o pacote. Então você vende dez produtos e não se especializa em nenhum.

E como se deu sua entrada na cooperativa? Na época que eu cheguei em Holambra, para produzir era necessário fica sócio de cooperativas, o antigo Cooperativa, porque ele dava assistência aos financiamentos para começar. Então assim se começava. Essa cooperativa não existe mais. Em 2001 as cooperativas saíram da cooperativa antiga e se fez uma cooperativa de flores, que é o Veiling, uma cooperativa de insumos e uma de pecuária. Então do antigo sobrou três. Com a mesma razão: focado em uma atividade.

Mas a sua entrada no Veiling? Eu já era Veiling. Porque o Veiling já existia antes e era uma cooperativa de cereais, frango, suínos, flores, citrus, verduras… mas isso não funcionou. Em 2001 o Veiling se focou no comércio de flores.

00

O Brasil passa por um período de instabilidade econômica. Percebe o mercado de flores sendo afetado? Sim. Temos crise econômica nas flores também. Um dos grandes problema é a inadimplência, está difícil para o produtor receber. E para o Veiling poder comprar ele precisa pagar as contas, então ele está mais retraído nas compras. Não está se arriscando. Ele compra o que ele vendeu. E não tem crise aparentemente. O faturamento cresceu, mas se você tem a inflação a 11% e cresceu 9%, então você não cresceu economicamente. Você precisa crescer acima da inflação. E o grande problema de produtores é que cada produtor produz diferente. E se você produz lírio, você precisa comprar um adubo importado da Europa. Isso é faturado em dólares ou euros, então temos um 50% de aumento, já que o real desvalorizou. Isso dá um custo maior. Fora a energia que está sendo inflada e subiu muito. Mão de obra sobe todo ano em 10%, que é a reposição da inflação. Todos os plásticos e coisas relacionadas ao petróleo são cotadas em dólar. Os insumos também. Então nosso custo está subindo muito. Acho que a margem está diminuindo. Não é que está ruim, mas bom também não.

No ano passado o mercado de flores movimentou R$ 6,2 bilhões. Então embora tenha sido maior que 2015 não significa mais lucro para o produtor… Não. Faturamento é um número, mas o que interessa é o lucro. A lucratividade que vai te manter no ramo.

Então o cenário brasileiro não está favorável para o mercado de flores? Não, nada. Acho que com a flor você tem que chegar diferente. Talvez produtos que não tenham um valor não tão alto na venda final, não irão sentir muito. Porque a flor ainda é um presente barato. Uma flor pequena custa até R$ 5. Agora produtos mais caros irão sentir mais. Porque é muito diversificado. Você tem florzinha assim [e aponta para uma kalanchoe em cima da mesa] e produtos de até R$ 500. Mas é difícil cifrar. Você tem grupos de produtos que vão bem e outros não. Porque temos produtos que todo ano vão menos.

E quais são os deste ano? O principal é a gérbera, que está diminuindo muito. E diminuiu porque outros produtos estão tomando o espaço dele. Tem outros, mas é difícil citar. Alguns perdem espaço porque a lucratividade não é suficiente. Outros produtos também tomam espaço do outros.

Quais alternativas o produtor tem para não sofrer com isso? Ele tem que produzir o que o mercado quer. Não o que ele gosta. Você tem que saber o que o cliente quer, a durabilidade de produto, as tendências de cor e se é lucrativo. Baseado nisso você toma a decisão. É fácil? Lógico que não. Mas se você está nesse ramo precisa procurar.

Quem dita essas tendências de mercado? Hoje não existem muitos produtos novos. Vamos dizer, há dez anos atrás existia mais importação, sobretudo da Europa. E hoje tem menos. Dentro de uma espécie há variação de cores e tipo de flores. Mas a gente não define cores, isso é moda. Alguém define. Quem define? Eu não sei.

Por que o Veiling só trabalha com mercado interno? O Veiling já trabalhou com exportação para os Estados Unidos e Holanda, mas ele encerrou esta atividade e torno de 2006, 2007 por causa do câmbio. O real se valorizou muito. Então o que você vende aqui você ganha poucos reais porque lá sai em dólar, euro. E isso não compensava. Hoje já mudou o cenário. Poderíamos voltar a exportar. Mas daí o Veiling precisa abrir de novo o setor de exportação. E são alguns meses trabalhando até encontrar os clientes. A única exportação que existe um pouco é Uruguai. Mas eu não chamo isso de exportação.

Ele tem empresas no Brasil? Na verdade eles compram e levam para lá. Mas é pouco. Não chamo de exportação porque é Mercosul. Mas Europa e Estados Unidos não vai não. E também não precisa (não que não precisa porque isso é um luxo de se falar) porque tem um mercado interno grande. Crescemos muito aqui. O Veiling tem um histórico que desde que começou há 27 anos, desde 89, ele cresceu sempre. O que o Veiling faz, na verdade, é investir em várias coisas como GranFlora e serviços que presta a clientes e tenta atrair mais procura para o produtor. Se ele traz procura para produto, os produtores vão ganhando dinheiro e querem produzir mais. Então você tem procura e oferta.

d

Unir a feira a Veiling Market com a Wedding Collection é uma estratégia pra isso? Na verdade o GranFlora é um segmento que o Veiling investiu para completar o mix do Veiling. E também é um mercado para que clientes pequenos possam comprar, já que no Veiling não dá. E o Veiling, em conjunto com as pessoas que alugam lá [GranFlora], fomenta consumo. Com isso eles ganham um público que normalmente não vem aqui. Aqui é uma feira para clientes do Veiling, o que é diferente. Então em conjunto funciona melhor. Mas sempre voltado para o consumo. Porque eu costumo falar que o Veiling não vende. O Veiling tem sistemas. Ele tem sistema clock, de intermediação e o Veiling on-line. Nesses sistemas, nós produtores colocamos nossos produtos e realizamos nossas vendas. O Veiling então não é nada mais que um ponte para o produtor vender.

Percebi na feira produtores com alternativas ao mosquito Aedes, transmissor da dengue, zika e chikungunya. Os terráreos, em destaque do evento, foi um deles. Esta preocupação com o mosquito é real? Sim, é real. Existe uma propaganda enganosa. Em Holambra o panfleto mostra uma violeta, com um pratinho embaixo, e vários mosquitos. Ou seja, quer dizer que a violeta é a grande multiplicadora de dengue? O grande causador da dengue é a água parada, não a flor. As pessoas é que tem consciência. Afeta o mercado da flor? Sim e não. No passado os cemitérios não podiam mais ter crisântemo. Bromélia também. A água que para no meio da bromélia não é novidade, porque bromélia é da natureza. Mas a água no lixo não. Acho que água parada naturalmente não é um problema, água no lixo sim.

Então a maneira como é feita a propaganda que é o grande catalizador de problema? Sim. Acaba prejudicando.

As alternativas dos produtores se tornam válidas… Sim, é válido. Mas eu não vendo potinhos juntos com as minhas plantas. Mas é bom que isso aconteça. É um problema que a gente tem que aprender a conviver.

03

Hoje, qual o estado tem maior participação nas vendas da Veiling? O estado de São Paulo. Mas Veiling vende quase 80% para os estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Minas, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Os outros 20% para Nordeste e interior, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Goiás.

O clima afeta a venda das flores? Em relação à plantas produzidas em locais de clima quente e vendidas para locais de clima frio? Afeta, mas tudo depende desde o início. Se o produtor precisa de cadeia de frio para produzir a flor, ele tem que plantar, colher, colocar num barracão climatizado, fazer uma boa pós colheita, transportar em um caminhão com câmera fria e depois vender. E aí cabe ao comprador de cuidar. Tem que ter essa cadeia para o produto ir longe. Se o comprador não cuidar, é lógico que a durabilidade vai diminuir. Mas tem que ter. Nós também temos produtos que não precisam disso, que são de climas tropicais. Mas normalmente flor de corte precisa de cadeia de frio. E isso é a nossa parte. Tentamos estimular sempre.

Em 2014 a região Sudeste do Brasil sofreu com a crise hídrica. Isso já foi superado ou se tornou um problema crônico? Quem produziu naquela época plantas para jardinagem ou ornamentais, tiveram muitos problemas. Porque as pessoas até podiam comprar, mas não podiam irrigar. Então esses produtores foram afetados. Mas assim que começou a chover já normalizou.

A partir daí foram criadas formas sustentáveis de plantio? Não. Acho que não. Como a gente cultiva é difícil falar como isso vai ficar para casa e jardim. Nós temos sim sistemas de inundações em que a água é toda reutilizada, nisso foi investido. Foi investido também em sistemas de captação de água de chuva, na criação de cisternas, diminuindo a captação de rios. Isso você tem. Até porque hoje você tem um limite de água para pegar nos rios, coisas que antes não havia. Agora é controlado.

Como avalia essa limitação? Acho boa. Você aprende a valorizar mais a água. Aprende a produzir com o que tem. Mas da pra melhorar muito ainda.

Você foi reeleito presidente do Veiling. Quais os desafios de presidir a cooperativa? Os desafios para os próximos anos… O primeiro é a crise que tem, pois temos que sobreviver às crises. Estamos faturando menos então temos que ser muito criativos para sobreviver e achar caminhos para trazer procura de compra. Porque o Veiling cobra taxa sobre a venda. Então o Veiling tem que trabalhar para que haja mais procura de compra aqui. Outro grande desafio é a torre de digitalização de venda. Hoje está muito rápido com os smartphones, então queremos que as vendas ocorra em 7/24: sete dias e 24 horas. Isso você consegue com tecnologias. Assim a pessoa pode comprar a qualquer hora do dia. Isso já está acontecendo na Europa, então temos que implementar também. Outro sistema é o clock, eu coloco um preço e o cliente pode comprar a hora que quer. Então tem vários sistemas. Isso gira mais vendas. Entre o Veiling e o Veiling antigo é tudo negócio de flores, plantas e agregados. E queremos que aqui seja a estrada de negócio de flores, plantas e agregadas. Isso é muito bom. Pois quem realmente quer isso terá referência aqui. Não na Veiling, mas em Holambra. Cabe a nós saber que nunca conseguiremos tudo aqui. Porque há pessoas que não vamos agradar. Mas o que interessa é que as pessoas venham aqui. Cabe a nós ser melhor. O bom vendedor não teme concorrência. O Veiling não quer ser o maior, o Veiling quer ser o melhor. Há outros desafios como unir os produtores. Ainda mais quando você tem crise as pessoas passam a pensar mais nelas. Então como deixar os cooperados juntos. Há outros desafios, mas esses são os principais.


Comentários

Não nos responsabilizamos pelos comentários feitos por nossos visitantes, sendo certo que as opiniões aqui prestadas não representam a opinião do Grupo Bússulo Comunicação Ltda.