27/12/2018

Pedros Negros geram debate em Holambra

“Os Pedros eram negros por causa da fuligem das chaminés”, afirma defensora de tradição em Holambra

Michael Harteman

A sociedade tem ficado especialista em rotular tudo rapidamente. ‘Aquela frase é machista, aquele ato é misógino e aquele feito é racista’. O combate a qualquer tipo de preconceito é e sempre será louvável. No entanto, a maior premissa do combate ao preconceito é mostrar às pessoas que elas estão erradas naquilo que pensam sobre algo ou alguém. Um racista pensa que o negro é inferior e é preciso convence-lo de que esse pensamento é abominável. A ideia de combate ao preconceito é consensual. No entanto, será que alguns rótulos de racismo, por exemplo, não seria também uma forma de preconceito?

A Polêmica

A maioria das definições da palavra preconceito é ‘juízo pré-concebido’, ou seja, um pensamento formado antecipadamente, sem lógica ou fundamento crítico que o justifique. O preconceituoso é, no fundo, um ignorante no que diz respeito a um determinado assunto.

A reflexão sobre preconceito, sobretudo o racismo, é algo que está em pauta nas redes sociais de moradores de Holambra. Tudo começou após um artigo publicado na segunda-feira (24), no qual uma jornalista critica a tradição dos Piest, em Holambra, na qual pessoas se pintam de preto e se transformam nos Pedros Negros. No texto, o tema é abordado como racista. Sim, existe certa base para a argumentação, já que o blackface, ato de pintar um branco para interpretar um personagem negro é visto como racismo.

A situação me faz lembrar uma frase repetidamente exclamada pela minha mãe. ‘Cada caso é um caso’. Sendo assim, é preciso analisar esse caso, dos Pedros Negros, com mais atenção e sem preconceitos. Qual é o objetivo de se pitar a pessoa de preto nesse caso? É para tirar sarro de pessoas negras? Inferiorizá-las? A reposta, mais simples do que parece, vem de Gabriela Wagemaker, integrante da Losango, organização que faz a festa de São Nicolau em Holambra. “Eu conheço a tradição desde pequena, sou filha de holandês, meu pai e minha mãe me contavam que os Pedros eram negros por causa da fuligem das chaminés. A gente aprende a tradição porque eles entravam em nossas casas por causa das chaminés”, exclama, inconformada, Gabriela.

A atitude de chamar a tradição de racista entristece Gabriela. “Dói, as pessoas que não conhecem já vão dizer que sou racista, o problema está na cabeça do adulto, e não na criança, as crianças entendem o que são os Pedros Negros, quem vê maldade são os adultos”, acredita Gabriela. Além disso, ela conta que foi ofendida nas redes sociais por ser uma das organizadoras da tradição holandesa em Holambra. “Um cara colocou na rede social:  “vindo de uma branca loira eu não poderia esperar nada pior”. Aí eu pergunto, é racista alguém se pintar de preto por causa da fuligem da chaminé, mas uma pessoa me ofender por eu ser branca e loira não?”, questiona.

Essa é a explicação nua e crua. Os Pedros ficam negros por causa da fuligem. Se a fuligem fosse rosa, ficariam rosa. Se bem que, na Holanda, na tentativa de acabar de vez com essa discussão, alguns sugeriram então que se pintassem os Pedros de outras cores. Talvez, o simples fato de sugerirem mudar a cor da tinta seja uma evidência de que não há racismo na tradição. Afinal, se fosse para menosprezar uma raça, a mudança de cor atrapalharia o objetivo. Gabriela acredita que não há motivo para mudar de cor. “Chegamos a pensar nessa possibilidade, mas a gente ensina as crianças que eles são pretos por causa das chaminés, que jeito que eu chego de um dia pro outro com os Pedros pintados de rosa? A fuligem da chaminé ficou rosa?”, questiona, novamente, Gabriela.

Luis Fernando da Silva, morador de Holambra, foi um dos que colocaram a matéria nas redes sociais. “Sim, conseguiram problematizar a tradição de Holambra (…) qual a dificuldade de entender que eles eram pretos porque desciam a chaminé?, questiona o morador na legenda de seu post. Além disso, Luis acredita que os questionamentos são na verdade uma falta de respeito com a tradição e o que ela realmente significa. “Fico muito chateado de ter que colocar mais 10 vezes, em todos os comentários, explicando que a cor preta é do carvão da chaminé”, argumenta Luis.

Sim, o racismo existe, é real e Luis sabe disso. “Sou branco e sei que por isso tenho privilégios, pois faço parte de um sistema errante, mas não há racismo nessa tradição holandesa, falo isso com propriedade pois meu padrasto e meus avós são da Holanda”, exclama.

Diversas pessoas comentaram a publicação em uma página no Facebook. A maioria reprovando a visão racista da tradição. “É uma cidade [Holambra] que irá sempre manter sua cultura e mostrar sua beleza”, dizia um comentário. “Não acredito, daqui a pouco vão querer acabar com a tradição! Minha filha prefere os “Pedros Negros” do que o Papai Noel”, dizia outro comentário. Um outro, ainda dizia: “ Tantos anos, uma tradição que marcou a todos nós em Holambra, sempre tem um para acabar com tudo isso, muito triste”.

Alguns comentários diziam que sim, a tradição dos Pedros Negros é sim racista. De acordo com essas pessoas, o fato de caracterizarem alguém sujo pela fuligem de uma chaminé ofende as pessoas negras. Para outros, isso não é um problema. É preciso respeitar as diversas opiniões. No entanto, fica evidente que todo julgamento contém seu lado controverso. Nem tudo é o que parece ser. Se de fato estamos diante de pessoas que se sujaram na fuligem das chaminés, não há racismo, ou há?

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