02/07/2017

“Bem-vindo à Marly-Gomont” e o humor da denúncia

Mesmo sendo bem-humorado e um filme bonito, as denúncias feitas em “Bem-vindo à Marly-Gomont” retratam o difícil choque cultural e preconceito

Verônica Lazzeroni Del Cet

 

Uma história real, uma família que enfrenta o preconceito racial e o desafio de lidarem com uma nova cultura, esses são os temas principais de ‘Bem-vindo à Marly-Gomont’. O filme de origem francesa decidiu relatar a respeito de uma comovente – mas complicada – história de um médico, sua esposa e seu casal de filhos. Comovente porque mostra o esforço e preocupação que o médico tem pela família, além da tentativa incansável de oferecer um futuro e oportunidades melhores para seus filhos que, antes de se mudaram para França, viviam no Congo com a família. Porém, também é uma história complicada a partir do ponto de vista que o filme quis enfatizar; preconceito racial e choque cultural.

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Eles são oriundos do Congo, um país no continente africano que lida com inúmeros desafios sociais, políticos e econômicos, ainda mais quando teve de enfrentar o período ditatorial, sendo que tal acontecimento apenas acarretou em mais dificuldades financeiras e em empecilhos aos cidadãos. A narrativa do longa-metragem é construída após esse período ditatorial e, portanto, os resultados e dias violentos da ditadura não são alvo do filme, nem sequer são mencionados.

Nosso protagonista principal, um médico, cursou medicina integralmente na França, sabendo falar muito bem o idioma e desejando um emprego em alguma clínica para agilizar o processo de obtenção da nacionalidade francesa, um ‘passaporte’ para uma vida boa de acordo com sua visão e pensamento. Ao aceitar uma proposta de emprego em uma clínica no interior da França e levar sua esposa e filhos para viverem lá, ele mal espera o que terão de enfrentar.

Moram em uma espécie de casa do campo, perto de pastos com muitas vacas. A cidade tem um clima frio, com chuvas constantes que chegam até irritar quem assiste ao filme. Contudo, o que mais incomodará essa família não é saber lidar com a nova casa ou com o clima tão diferente do Congo, mas sim com o choque cultural e com habitantes que os desprezam por ignorância, por preconceito ou por receio, afinal, nunca conviveram com habitantes negros.

O desafio a ser vencido pode apenas estar concentrado no preconceito racial que as crianças sofrem na escola ou quando a esposa do médico tenta comprar legumes na feira da praça central da cidade, mas o médico terá um desafio ainda maior e que é conquistar a confiança de qualquer habitante, pois caso contrário, ele não terá paciente algum e, consequentemente, nenhum dinheiro para suprir as necessidades de sua família. O prefeito da cidade, quem convocou o médico após muita insistência, enfrenta a oposição em período eleitoral, a qual não mede esforços para terminar com todas as chances de aceitação dos novos habitantes de Marly-Gomont pela população.

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O choque cultural e o preconceito racial são os cruéis companheiros desta família. Eles deverão aprender uma nova cultura que não lida com as pessoas, com a família, com a vida da mesma forma como eles encaram. O longa-metragem vai além do que apenas dramatizar esse tipo de situação que se repete cotidianamente, ainda mais comum no interior da França, ele consegue explorar em minúcias tudo o que teve de ser feito para se sentirem em casa.

Apesar de estar abordando um tema tão delicado e que possivelmente deixaria uma atmosfera tensa durante a narrativa, o diretor e produtor conseguiram transformar uma história real e com muitos momentos difíceis em uma narrativa bem-humorada, fazendo o filme ser classificado como comédia e não drama.

Ao final de sua vida, o médico entende a respeito de quão desafiador foi viver em Marly-Gomont, mas não pode descartar a experiência que teve, assim como sua luta para provar que mesmo sendo de outra cultura era e sempre seria igual, com direitos e com capacidade para exercer sua profissão.

Direção: Julien Rambaldi

Elenco: Marc Zinga, Médina Diarra, Aïssa Maïga, Bayron Lebli

Gênero: Comédia

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Verônica Lazzeroni Del Cet é estudante de Letras na Unicamp


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